Memórias do Holocausto: conheça os relatos de três sobreviventes que moram no Brasil
Em 1943, Nanette, seus pais e seu irmão foram capturados e levados para o campo intermediário de Westerbork, na Holanda. Nesse mesmo ano, seu pai morreu vítima de infarto e sua mãe e seu irmão foram deportados. Nanette foi levada para Bergen-Belsen, também conhecido como “Campo de Horror”, em 1944, aos 15 anos. Lá, a jovem reencontrou sua amiga Anne e sua irmã, Margot Frank. Em uma entrevista concedida à Revista Exame, ela disse: “Ela já não era a mesma Anne de antes e eu não era a mesma Nanette. Havíamos passado por muita coisa”. Anne Frank morreu em Bergen-Belsen em março de 1945, dias antes dos britânicos libertarem os prisioneiros, deixando para trás seu famoso diário.
Nanette, hoje com 90 anos, foi um dos 60 mil sobreviventes que os soldados britânicos encontraram naquele domingo de 15 de abril de 1945. Atualmente mora em São Paulo e guarda objetos da época mais sombria de sua vida, como fotografias, cartas e sua estrela de Davi que servia como identificação dos judeus durante a Segunda Guerra.
Ela se dedica, há mais de duas décadas, a dar palestras em escolas sobre as atrocidades do Holocausto, porém, por conta da idade, o número tem diminuído. Em 2015, foi publicado o livro “Eu sobrevivi ao Holocausto”, onde Nanette narra sua história antes, durante e depois do período que marcou para sempre sua existência.
“Vou morrer lutando para que seres humanos não sofram nem percam sua dignidade como aconteceu com os judeus naquela época, como aconteceu comigo.”
- Trecho do livro Eu sobrevivi ao Holocausto
Andor Stern
Andor Stern foi o único brasileiro nato a sobreviver ao Holocausto. (Foto: Gustavo Amorim/Aventuras na História) |
Na juventude, Andor conseguiu emprego em uma fábrica de eletrônicos. Logo os nazistas ordenaram que os judeus passassem a viver no gueto, separados do restante da população, mas, o brasileiro decidiu ficar e morar na fábrica em que trabalhava. Dias depois, ele soube que o gueto havia sido bombardeado. Andor entrou em desespero, pois era onde a sua família estava.
No dia seguinte, um oficial nazista foi até a fábrica com o propósito de levar metade dos judeus que ali trabalhavam – dez no total. Andor questionou se o oficial os levaria para o mesmo local para onde os moradores do gueto foram levados. A resposta foi incerta, porém, mesmo assim, ele se ofereceu para ir, aos 15 anos. O plano de reencontrar a família deu certo e eles se abraçaram novamente em Auschwitz. Entretanto, não demorou muito para que fossem separados de novo, e desta vez, para sempre.
Em meio ao cenário de morte em que vivia, Andor construiu uma linda amizade com Luis Berger, também sobrevivente. Ele recorda que um ajudava o outro durante os dias nos campo. Em um momento de sua vida, o brasileiro pensou em cometer suicídio, mas lembrar que seu avô o chamava de “brasileirinho” lhe deu força e o fez querer retornar a sua terra natal.
Por fim, no dia 1º de maio de 1945, Andor Stern foi resgatado por oficiais americanos. Retornou ao Brasil em dezembro de 1948, aos 20 anos. Sua história está documentada no livro “Uma Estrela na Escuridão – A Incrível História de Andor Stern, o Único Brasileiro Sobrevivente do Holocausto”, escrito pelo professor e historiador Gabriel Davi Pierin.
“O ser humano é uma coisa fantástica. Ele é capaz dos gestos mais lindos, mais altruístas, mas também dos mais ordinários.”George Legmann
- Andor Stern, em entrevista ao Aventuras na História, do Uol
George Legmann é hoje um dos mais jovens sobreviventes do Holocausto. (Foto: Iara Morselli/Glamurama) |
O engenheiro George Legmann, de 76 anos, possui uma particularidade em relação aos demais sobreviventes: ele nasceu em um campo de concentração.
Cinco dos sete bebês que nasceram no campo de concentração de Dachau. À direita está Elisabeta segurando George no colo, em maio de 1945. (Foto: Reprodução/Museu do Holocausto) |
“Acho importante a iniciativa de contar para as novas gerações o que aconteceu [...] para não se repetir [...], porque é inadmissível que no século XXI ainda tenha mandatários que negam a existência do Holocausto e que também negam os direitos humanos.”Relembrar para não esquecer
- George Legmann, em entrevista à TV Senado
Após 75 anos do genocídio que horrorizou a humanidade, as lembranças daqueles dias estão gravadas em fotografias, escritas em livros e eternizadas na memória dos que os viveram. Contudo, Hélder Viana explica que relembrar este período da história divide opiniões: “Alguns grupos defendem certo esquecimento da memória desses dias, não por compactuarem com o nazismo, mas por ser uma memória muito traumática e dolorosa para quem passou por aquilo. Para outros, deve, sim, haver essa lembrança, justamente para não ocorrerem os erros do passado”.
O professor conclui ressaltando: “É importante relembrar e refletir sobre isso, justamente para abominar as políticas desses estados autoritários, segregacionistas e genocidas, como foi o da Alemanha nazista. O Holocausto mostra bem o que o extremismo político é capaz de fazer: criar uma realidade tão tenebrosa como foi o Holocausto”.
Nenhum comentário