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Podas agressivas no Campus

Infraestrutura justifica ação como meio de combater parasitas


Por Henrique Mendes e Tiago Silva


A sombra das árvores nas mesinhas do calçadão entre o prédio do cchla e o setor II está entre um dos abrigos mais procurados pelos estudantes que circulam pela região da Biblioteca Central, principalmente às horas de sol mais intenso. Porém, nas primeiras semanas de agosto, as árvores que ali existem foram alvo de uma operação de poda, por alguns considerada excessiva, mudando o cenário do local drasticamente.

A Secretaria de Infraestrutura da UFRN (Sinfra), por meio de serviço prestado pela empresa Apoio Comércio e Serviços Ltda, vencedora da licitação aberta pela Universidade para o ano de 2017, realizou a ação de poda, concluída no último dia 11, nas árvores do Departamento de Ciências Humanas, Letras e Artes, em frente à Biblioteca Zila Mamede e em outros pontos como nos setores II e V e no Núcleo de Práticas Jurídicas. Depois disso, muitas árvores podem ser vistas com pouquíssima folhagem e lenhos dos galhos serrados à mostra, o que tem gerado insatisfação de quem costumava usar a sombra e de quem entende os malefícios que essa poda excessiva pode trazer à planta, como apodrecimento do troco e aparecimento de partes ocas pela ação de fungos e bactérias.


Árvores entre o setor II e o CCHLA (foto: Tiago Silveira)

Bruno Macêdo, biólogo da Diretoria de Meio Ambiente da UFRN, reconhece que a podas em torno do CCHLA foram agressivas, e que foram feitas para retirada de ervas daninhas. “Se você fosse fazer uma análise das copas, mais de 90% eram ervas daninhas". As árvores parasitadas funcionam também como ponto de dispersão, disseminando o parasita para outras árvores.

Questionado sobre se essa retirada excessiva de copa pode prejudicar a árvore, o biólogo responde que a infestação excessiva é mais prejudicial que a poda excessiva. “A infestação excessiva, além de ser risco iminente, ela é risco contínuo, porque ela está dispersando a espécie invasora.  Apesar de a poda excessiva dificultar a recuperação da árvore, a erva não permite esta recuperação”.

Macêdo explica que as podas podem ocorrer por três principais motivos – manutenção, adequação e segurança.

As podas de manutenção são, sobretudo, para adequação da copa quando esta está desproporcional ao tamanho da árvore, ou por questões paisagísticas e de segurança. O biólogo explica que, geralmente, esse processo segue alguns critérios, como tirar, no máximo, 30% da copa.

As de adequação ocorrem, por exemplo, em situações em que a árvore representa obstáculo para cadeirantes ou deficientes visuais. Ou ainda quando a árvore está em atrito com algum prédio. Além disso, adequações de segurança são feitas quando há interferência com a infraestrutura subterrânea ou aérea, como fiação elétrica. “Tem casos em que você pode, literalmente, eletrificar a árvore”, conta.

Podas de segurança, por fim, ocorrem quando a árvore apresenta características biológicas negativas. Bruno explica que temos problema sério de erva-daninha Universidade. A erva-de-passarinho, por exemplo, suga os nutrientes da árvore, que, fraca, fica vulnerável ao ataque de outros parasitas, como cupim e formiga.

Fazendo uma análise das espécies na região da operação, percebe-se que há pouca diversidade, entre nativas e estrangeiras, o que faz com que, quando em crise de infestações de parasitas, tenhamos no Campus uma infestação mais rápida. Espécies estrangeiras, como jamelão e azeitona roxa, oriundas da Índia, que não tão bem adaptadas às condições e parasitas locais, precisam de manutenções mais constantemente; ao contrário das espécies nativas, a exemplo do cajueiro e ipê amarelo, que são mais resistentes e adaptadas, despendem de um nível de manutenção menor. Bruno diz que está sendo posto em prática estudo já desenvolvido para diversificar a arborização do Campus.

Galho de árvore derrubado pela ação da erva-de-passarinho
(foto: Diretoria de Meio Ambiente)
De acordo com dados da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, as árvores contribuem para a permeabilidade de água no solo, propiciando o deslocamento e troca genética da fauna e dispersão de sementes em ecossistemas alterados pela ação humana (corredor ecológico), formando barreiras contra ruídos, ventos e alta luminosidade; e, sobretudo, capturando e armazenando carbono, atividade essencial para diminuir consequências do efeito estufa.

A Universidade tem um sistema de reflorestamento em funcionamento por meio da Diretoria de Meio Ambiente (DMA), o PROArvore, como meio de suavizar as ações decorrentes das adequações de infraestrutura, que produz 250 mudas por mês.

A referida adequação de infraestrutura decorre das frequentes obras por toda UFRN. A exemplo do Instituto Ágora, algumas construções demandam o desmatamento completo da área para que um novo edifício seja erguido no lugar. Questionamos, porém, se o reflorestamento acontece em igual medida ao danos causado pelas obras.


E as árvores de Natal?

Embora a lei 6.058/2010 saliente em seu primeiro capítulo que toda a vegetação de porte arbóreo existente ou que venha a existir, assim como as mudas plantadas em vias públicas na capital é bem de interesse comum a todos, em Natal o panorama da arborização segue o tom da maioria das cidades brasileiras: a presença de árvores restringe-se às avenidas centralizadas, praças, parques e áreas florestais, com baixa variedade de espécies, o que, de acordo com pesquisadores da área, não garante a efetividade da funcionalidade da vegetação nos meios urbanos.

Ademais, a cidade ainda realiza o depósito dos resíduos de podas em aterro sanitário . instalado em outubro de 2015, fica localizado no bairro Guarapes e está em funcionamento atualmente. Esta prática é vista com maus olhos por diversas organizações ambientais por ser resultante de problemas como a degradação da paisagem, poluição da água e ar nas grandes áreas destinadas para a alocação desses resíduos, aumentando, inclusive, as chances de incêndio nos aterros.


Contestação em pilastra do Setor II (Foto: Tiago Silveira)

As múltiplas necessidades de uso do espaço urbano, como estacionamentos e rede de fiação elétrica, acabam por desprezar a manutenção do acervo de árvores nas cidades modernas capitalistas. As soluções vão desde a adoção de um modelo subterrâneo de fiação, a adequação e padronização da construção das calçadas, até implementação de políticas públicas que utilizem os mecanismos de planejamento como forma de explicitar o papel do cidadão e da prefeitura nas dinâmicas de plantio e manejo das árvores.

Em um ambiente cada vez mais urbanizado, a importância de defender a preservação do patrimônio arbóreo restante torna-se ainda maior. Temidos por grandes empresários, ecólogos e biólogos, conhecedores da dinâmica da natureza, são profissionais indispensáveis neste sistema incompatível com o verde.

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