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Nem presa, nem morta

Ato pela descriminalização do aborto em Natal reúne mulheres em frente ao Midway Mall 

Por Tiago Silva 

Mulheres com cartazes em apoio à descriminalização do aborto. Foto: Tiago Silva/Caderno de Pauta 

No dia da votação no Senado argentino da lei do aborto, após aprovação do texto pela Câmara, ocorreram vários atos simultâneos no Brasil e na América Latina, para exigir dos Estados a garantia de aborto legal, seguro e gratuito. Em Natal, o ato foi organizado pela Frente Estadual pela Legalização do Aborto e reuniu mulheres em frente ao shopping Midway Mall na última quarta-feira (08). 

Fernanda Psoa, do Movimento Mulheres em Luta, diz que lutar pela descriminalização do aborto é lutar pela vida e pela saúde das mulheres, para que elas não morram ou fiquem sequeladas após procedimentos mal feitos, e também pelo direito à autonomia ao corpo, para que a mulher possa decidir quando quiser fazê-lo. Fernanda destaca a importância de se fazer o recorte de raça e classe no debate sobre o aborto. As mulheres pobres, sobretudo negras, são as que mais sofrem com a não garantia do aborto seguro e gratuito pelo Sistema único de Saúde (SUS). Mulheres ricas, no entanto, podem pagar clínicas e ter toda a assistência necessária para realizarem o procedimento sem riscos. 

Aborto ainda é tabu 

Mulheres vão para o meio da Salgado Filho em
favor descriminalização do aborto.
Foto: Tiago Silva/Caderno de Pauta  
Falar sobre aborto no Brasil ainda é assunto delicado. Marie, do coletivo Pão e Rosas, conta que foi aberto espaço pelos governos petistas à Igreja, tanto com a Carta ao Povo de Deus quanto com o acordo Brasil-Vaticano. “O governo do PT, que se dizia um governo dos trabalhadores, se dizia um governo em defesa das mulheres, na verdade entregou os direitos das mulheres às igrejas”, diz. Em prol da governabilidade, esse governo não discutiu com as mulheres, que sabem por que o aborto tem que ser legalizado. Ela atribui a isso também setores conservadores que querem calar os direitos das mulheres. “É fundamental que o movimento de mulheres reconheça quem são seus inimigos e quem são seus aliados, para poder efetivamente lutar pelo aborto legal, seguro e gratuito, garantido pelo SUS”. 

Frases como “Se não quer engravidar, não faça sexo”, ou “Se não quer ter filho, use camisinha”, por exemplo, são comumente ouvidas de pessoas contrárias ao aborto, sempre no sentido de culpabilizar a mulher. “Nem sempre uma mulher tem condições psicológicas, financeiras para levar uma gestação adiante. E a gente sabe que a questão de ‘Não quer engravidar, não abra as pernas’, não é uma coisa que se aplica, porque todos os métodos contraceptivos que existem hoje são falhos”, explica Layane, militante do Juntos!. 
Carros e motos buzinam e aceleram,
ameaçando ultrapassar o bloqueio.
Foto: Tiago Silva/Caderno de Pauta 

Gabriela tem 22 anos e é de Brasília. Estuda Serviço Social e está há poucos dias em Natal fazendo mobilidade acadêmica. Diz que parte da dificuldade de falarmos sobre aborto no Brasil é devido à nossa estrutura social patriarcal e machista. “A gente tem um tabu a respeito da sexualidade, do sexo em si; e de métodos contraceptivos, a respeito da educação sexual. Não temos isso na educação básica, e isso reverbera na formação de consciência da população”. 

Ela fala também sobre as perseguições e ameaças que a pesquisadora Débora Diniz, do Anis – Instituto de Bioética, e professora da Universidade de Brasília vem sofrendo devido à defesa da descriminação do aborto. Débora é coautora da Pesquisa Nacional do Aborto (2016), estudo referência sobre o tema no país. 

Diálogo 

As mulheres levaram suas reivindicações para o meio da Avenida Salgado Filho, com cartazes e palavras de ordem para chamar atenção quando o sinal fechava. Em alguns momentos, mesmo com o sinal liberado, elas continuaram na resistência, bloqueando a Avenida. Alguns carros e motos buzinavam, aceleravam furiosamente e ameaçavam romper o bloqueio. Fernanda diz que é importante dialogar com tranquilidade com esses setores que ainda não tem consciência da luta das mulheres pela descriminalização do aborto, para que eles possam ser aliados nessa luta. “Espero muito que os ventos da Argentina soprem aqui para o Brasil e que a gente consiga legalizar o aborto também”. 

Socorro segura cartaz em favor da descriminalização do aborto. Foto: Tiago Silva/Caderno de Pauta 

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