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Dezenove é bonito

*Por Luiza de Paula

(Foto: Reprodução)
Agora você está inquieta. Agora, não. Há dias. Há semanas. Há 20 anos. Próximo domingo é dia dos pais. Você pensa coisas trágicas, o que não é privilégio do doze do oito, mas sim de todas as datas comemorativas e, por sinal, daqui a três dias é o seu aniversário de vinte anos.

“Vinte” é a junção de cinco letras que parece carregar consigo todo o fardo do mundo. A pronúncia do “v-i-n-t-e” é uma poucas a não cair no automatismo diário e, absolutamente todas as vezes que é pronunciada, gera uma reflexão de modo que não sei se alguma vez vou me acostumar com a sua sonoridade e significâncias. É a segunda parte da vida e parece que foi ontem que li o convite de uma amiga dizendo: “venha comemorar comigo a minha primeira década!”. Do nada, caí de paraquedas na segunda – ou não. Morri de ouvir que “depois dos quinze... Ah, minha filha, depois dos quinze...  Tudo passa tão rápido.” Suspeito que não dei a devida importância, mas qual diferença iria fazer? O correr do tempo é irremediável para os vivos. De toda forma, “vinte” é difícil de ser deglutido. E mais difícil ainda quando nos últimos dias dos seus dezenove, você ainda não fez tantas coisas que deveria ter feito e tem uma espécie de dívida consigo mesma. Entrar no segundo tempo com o nome no SPC/SERASA? Mas, quem nunca? Viver é, basicamente, dívida e incompletude. E tudo bem.

O “Dezenove” carrega consigo uma certa complacência e permissividade. É uma espécie de proteção para quase todas as eventuais cagadas que um ser humano possa fazer, o que dá um certo confortinho na alma. Dezenove é sonoro. Aconchegante. É aquele café com bolo. É amor. É cerveja gelada na praia ao som de Caetano e Los Hermanos. É até permissão pra poder ser de esquerda de modo relativamente sossegado, caso contrário, você ultrapassou a quota etária para acreditar na justiça social  e para ser fã dos idealismos em geral. Dezenove prevê sucesso em qualquer área da vida e isso quem está dizendo não sou eu, pessoa física, é a numerologia.

“Vinte” me obriga a ser adulta e disso não há escapatória, é tipo o colágeno caindo com a idade, as marcas de expressão fazendo morada, a obsolescência programada do iPhone – aproximadamente 3 anos – e a ida ao generalista com mais frequência. Vinte parece palavra posta na prateleira usada apenas por gente grande e eu, no auge de cento e cinquenta e três centímetros, calçando trinta e cinco, não me sinto nesse lugar de fala. “Vinte”, dizia Marcelo Camelo, é só o começo do fim da nossa vida e prepare uma avenida que a gente vai passar. Vamos passar sim. Com ou sem medo. Saudando ou não o passado. Compreendendo ou não o presente. No nosso lugar de fala ou não.  Com o nome no SPC/SERASA ou não. Estamos imersos nessa roda de samba lindíssima que é a vida. Está decretado que “vinte” também é bonito. Está definido. Com prego batido e ponta virada.

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