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A Política por Trás da Bola

Uma série de perfis nem tão futebolísticos dos 32 países da Copa do Mundo da Rússia 

Por Yuri Gomes

Edição: Paulo Prado/Caderno de Pauta
Em 48 horas a bola vai rolar em Moscou: a partida entre Rússia e Arábia Saudita abrirá aquele que é o evento esportivo mais assistido no mundo. Os gramados, os uniformes e os símbolos da Copa do Mundo estarão cheios de motivações políticas. Desde que o samba é samba é assim e isso não pode ser ignorado, nem muito menos silenciado, como fazem setores da imprensa esportiva. 

A Federação Internacional de Futebol (FIFA), a organizadora do mundial, possui mais associados que a própria ONU: são 211 países-membros, distribuídos em seis confederações, contra os 193 das Nações Unidas. Para alcançar tal patamar, a instituição sempre utilizou-se de meios pouco éticos para levar à frente os seus negócios, como a promíscua relação entre seus dirigentes e políticos, muitas vezes ditadores. Como protocolo, os únicos que podem segurar a taça da copa são os campeões, ex-campeões e... chefes de Estado. Não há caudilho que resista à tentação. 

Os exemplos são muitos e o primeiro remonta à segunda edição da Copa, em 1934. Na ocasião o evento, realizado na Itália, serviu de propaganda para o regime Fascista de Benito Mussolini. Em 1978, o mundial teve como sede a Argentina, que vivia sob a brutal ditadura de Jorge Rafael Videla e sua junta militar. A poucos metros do palco da final, o Estádio Monumental de Nuñez, presos políticos eram torturados na Escola de Mecânica da Armada. Os donos da casa, liderados por Mario Kempes, foram campeões; o general entregou a taça e a euforia da vitória esfriou a revolta e o descontentamento popular. 

Na França, em 1998, Estados Unidos e Irã caíram no mesmo grupo. Apesar de toda tensão geopolítica envolvida, o futebol deu conta de apaziguar a tarde em Lyon e americanos e iranianos deixaram o ódio fora das quatro linhas; em belo gesto, deram as mãos e tiraram fotos juntos, antes do início. Placar: 2x1 para o país dos aiatolás e a sua primeira vitória em mundiais. 

Não pode se esquecer o mais famoso causo envolvendo a seleção brasileira e a política. Em 1970, no México, a seleção foi esmagadora: Pelé, Tostão, Jairzinho, Gérson, Rivelino, Carlos Alberto trouxeram o tricampeonato do Brasil, após empurrar quatro gols nas redes da Itália. No país, o brilhantismo da canarinho foi capturado pelo regime militar, que surfou na popularidade do time e ganhou força, em meio à repressão institucionalizada. 

Corrupção, protestos contra o governo e instabilidades na geopolítica da Rússia marcaram os preparativos para a Copa do Mundo. Entre a presidência e o cargo de primeiro-ministro, Vladimir Putin perpetua-se no poder há 18 anos com a sua campanha implacável de perseguição de opositores políticos. Grandes empresas de comunicação viraram canais da propaganda estatal, a imprensa independente está sufocada e jornalistas críticos ao governo sofrem perseguição. No ranking mundial da liberdade de imprensa, da ONG Repórteres sem Fronteiras, o país ocupa a posição de número 148 entre 180 países. Democracia de fachada, autocracia Putin, compadrio e silêncio da FIFA. 

Na semana passada, a Argentina de Messi cancelou, de última hora, um amistoso contra a seleção de Israel, a ser realizado em Jerusalém. A partida, anunciada para o último dia 7, foi duramente criticada pelos palestinos e pela comunidade internacional, os quais a interpretaram como um apoio político argentino ao estado judeu, que comemora, este ano, os 70 anos de sua fundação.

Novamente, episódios em que política e futebol funcionam como uma coisa só são inúmeros. Denunciar a falta de transparência e a corrupção da instituição responsável pelo esporte mais praticado no mundo não é chatice; expor a captura do torneio pela propaganda autocrata do presidente russo não tira a importância dele para milhões de pessoas nos cinco continentes. A intenção sempre é tornar o jogo mais democrático, transparente e limpo, porque apaixonante ele sempre será. Para isso, não podemos nos esquecer de Nelson Rodrigues: "no futebol, cego é o que só vê a bola". 

Tentando analisar a política atrás de cada tiro de meta, escanteio, paulistinha, carrinho e mão na bola, o Caderno de Pauta publicará uma série de perfis com curiosidades diplomáticas sobre os 8 grupos e os 32 países da Copa do Mundo. 

Faltam dois dias.

Um comentário:

  1. Começo a enxergar uma galera jovem, assim como você, que estão vivenciando uma " New Wave " politizada, vivendo e olhando fora da caixa,Valeu Yuri.

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