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Fotografia, Memória e Identidade: A importância de se reconhecer

Por Marcelha Pereira e Suzie Chagas

Como você se enxerga no espelho? E o mundo à sua volta? Você sabe quem foram seus avós e pelo quê viveram? Qual era a realidade deles? É diferente da sua de agora? Mas e o que falta ser conquistado? Como você deseja o seu futuro?

Ministrada por Raimundo Melo e Talita Barbosa, a conversa “Fotografia, memória e identidade” começou às 13h do dia 12 de abril, no palco Educação do Futuro, na área gratuita da Campus Party. O objetivo foi abordar o trabalho desenvolvido com crianças e adolescentes de comunidades quilombolas e de escolas públicas no Projeto RPTV - Educação, Cultura e Comunicação. Através da fotografia e da produção de conteúdos, eles dão oportunidades a esses sujeitos de protagonizarem a própria história.

Talita Barbosa. Foto: Equipe Grupert
Desenvolvida pelo Centro de Documentação e Comunicação Popular - CECOP, a Rede Potiguar de Televisão Educativa e Cultural surgiu em junho de 2010 e foi implantada inicialmente no município de Currais Novos. Visando a documentação e difusão de práticas educativas transformadoras e o fortalecimento da identidade cultural, além do desenvolvimento audiovisual no Estado, a TV estimula a participação popular e a democratização da mídia.

Tudo isso é possível por meio do que chamam de Tecnologia Social: o envolvimento com a sociedade e articulação entre o saber popular e o científico. A revolução tecnológica, assim como o mercado capitalista cada vez mais variado, contribuem para maior acesso à câmeras fotográficas e isso deve ser aproveitado. Partindo dessa visão, o projeto se sente no dever de construir tecnologia com e para comunidades carentes. 

Para eles, todos possuem o saber e o olhar necessários para construírem com algo, só falta o conhecimento técnico. “Utilizamos fotografia no processo educativo para produzir conhecimento e bens culturais. Cada um tem o veículo de comunicação nas mãos”, afirma Raimundo. Quanto mais essas comunidades conseguirem produzir conteúdo, maior será a democratização do espaço. 

Raimundo Melo. Foto: Equipe Grupert
Porém, antes de produzirem conteúdo, cada membro da comunidade precisa trabalhar a forma de registrar sua memória, para só então, construir uma memória coletiva. E criar uma memória significa entender o passado e o presente para planejarem, juntos, um futuro. 

“O que é importante para contar a própria história de vocês?” é uma das perguntas feitas para incentivar o processo criativo dos adolescentes e crianças. Nesse momento, o sentimento de identificação é trabalhado em cada um deles. Como eles se identificam enquanto sujeitos de uma sociedade é o ponto mais sensível de todo o projeto, segundo os palestrantes. 

“Pelo menos para mim é um aprendizado singular. Singular, porque eu me considero negra, minha família por parte de pai é negra e eu nunca pensei vivenciar tão de perto a realidade um negro no Brasil, como a dessas comunidades que vivem isoladas de tudo. Poucos têm acesso às três refeições do dia, são muito carentes em tudo, e de repente você chega com uma proposta dessas e mexe muito com eles. Você chegar lá com um cabelo liso é diferente para eles, com a unha pintada ou com uma pulseira é, também, diferente. Então, qualquer coisa que a gente faça nessa comunidade traz um aprendizado enorme. E para mim, isso é um retorno enorme, não tem nem como mensurar. Dá muita vontade de fazer mais e mais por eles”, Talita afirma, emocionada.

Ela comenta que foi, e ainda é, difícil chegar em uma comunidade e ver que as pessoas inseridas na localidade não se reconhecem bonitas por causa de padrões estéticos impostos socialmente pela mídia hegemônica, por exemplo. É por isso que o projeto também luta para inseri-los em um ambiente de resistência, no qual eles se reconheçam como são e sintam orgulho disso.

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A RPTV já ganhou três prêmios pelo trabalho desenvolvido: Observatório Nacional de Boas Práticas e Projetos Inovadores em Direito da Criança e Adolescentes da Secretaria Nacional de Direitos Humanos em 2010; o Prêmio Nacional Itaú Unicef em 2013; e o Prêmio Pontos de Memória em 2015. Há intenção de ampliar o projeto à outras comunidades, mas o Centro de Documentação e Comunicação Popular depende da aprovação governamental para ajudar nos custos. 

Todas as produções realizadas no projeto voltam para a comunidade através de exposições, fazendo com que a articulação entre os seus membros seja extremamente enriquecedora. Depois de uma hora de conversa, resta o sentimento de que a comunicação e a tecnologia são para o povo. A democratização começa no momento que entregam uma câmera fotográfica nas mãos de uma criança negra de 6 anos e perguntam: Como você se enxerga no espelho?

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