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Marielle Franco, Edson Luís e os ataques à democracia brasileira

Por Vanessa Islany

Nenhuma morte é mais importante que outra, mas é fato que o simbolismo de alguns assassinatos tenha marcado a nossa história.

28 de março de 1968: Edson Luís. Jovem de 18 anos. Estudante secundarista. Filho de uma pobre família paraense. Assassinado pela polícia militar no centro do Rio de Janeiro, durante uma manifestação estudantil. 

14 de março de 2018: Marielle Franco. Mulher. Negra. Feminista. Lésbica. Oriunda da favela da Maré. Socióloga formada pela PUC e vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL. Executada na região central do Rio. 

Esses acontecimentos demarcaram o caráter fascista de uma parcela da população brasileira, que vem, a cada dia, afrontando a nossa democracia. 

Estamos presenciando tempos de golpe e de aumento nos ataques a líderes sociais no país. Diante da recente execução da vereadora Marielle e o atentado contra a caravana do ex-presidente Lula, considerado um dos maiores líderes populares, um episódio marcante na história do Brasil acaba de completar 50 anos.

Nascido em Belém, Edson Luís era filho de uma família pobre e para poder cursar o segundo grau, mudou-se para o Rio nos anos 60. Foi durante um protesto estudantil, que reivindicava melhoria na estrutura e na alimentação dos estudantes, que Edson foi baleado no peito e executado pela polícia militar do Rio de Janeiro. A morte do estudante foi o estopim para o movimento de resistência contra a ditadura militar e suas atrocidades. 

As mortes de Edson e de Marielle se relacionam tanto em suas causas como em suas consequências, pode-se estender a análise a diversos países, mas nossa história é marcada por casos de comoção popular que animaram debates e lutas políticas. Em ambos os casos, milhares de brasileiros transformaram o luto em luta. Embora casos de homicídios faça parte do nosso cotidiano e se exponha em altas estatísticas, a violência do Estado ou da criminalidade, por vezes, carrega tamanho simbolismo que não se faz presente na nossa rotina. 

Rememorar a morte de Edson no contexto atual não é uma aleatoriedade. Ambos foram assassinados por incomodarem uma ordem poderosa que visa controlar as vozes, os corpos, as ideias e as massas. Com meio século de diferença, há um elo perceptível entre as mortes do estudante e da vereadora, não por terem sido casos comuns de execução, mas por serem vistos como casos de crimes políticos, que moveram multidões dentro e fora do Rio de Janeiro. Com todo o simbolismo e velados no mesmo local, Edson Luís se tornou um ícone na luta contra o sistema de ditadura e se transformou em mártir das manifestações estudantis, enquanto a figura de Marielle representa as ideias que ela defendia em vida, como o fim de qualquer tipo de desigualdade e exploração.

Além disso, as duas mortes dialogam, diretamente, com os ataques que a democracia brasileira vem sofrendo. Podemos interpretar a morte Marielle como uma nítida tentativa de intimidar todos aqueles que lutam, como ela, contra a desigualdade social, racial, de gênero, a violência do Estado e todas as formas de opressão. Podem querer tirar nossa voz com atos bárbaros, como aconteceu com Edson e Marielle, essa é uma atitude típica do fascismo. O esquecimento sobre essa morte implica, consequentemente, na impunidade que prevaleceu durante o regime ditatorial, assim como também está presente na contemporaneidade do nosso Estado, Estado esse que se autoproclama, ainda que de maneira pretensiosa, democrático e de direito. 

Estamos vivendo um período histórico, no qual se estende várias desigualdades, algumas são frutos da retirada de direitos, outras da discriminação e marginalização de jovens, pobres, mulheres, negros e negras. Este é um momento de coação sobre a democracia do país, onde todos que se posicionam a favor de seus direitos e contra a ordem maior, como fizeram Edson e Marielle, se encontram em uma posição de ameaça. Os golpes, a intervenção militar, a retirada de direitos, o aumento das desigualdades e, principalmente, o fascismo são marcas do processo de coação. 

Acima, registro feito na Cinelândia durante o velório do estudante Edson Luís, assassinado em 28 de março de 1968. Abaixo, registo feito na Cinelândia durante velório da vereadora Marielle Franco, assassinada em 14 de março de 2018.

Edson Luís e Marielle Franco, respectivamente.

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